Ao longo das últimas semanas, a Sociedade Portuguesa teve a oportunidade de conhecer e refletir sobre a posição dos diferentes partidos políticos, no que diz respeito às mais variadas temáticas, nomeadamente desenvolvimento económico, saúde, educação, finanças, ambiente, segurança, entre outros, através dos debates televisivos, entrevistas e, mais recentemente, através de comícios e arruadas. A campanha destes mesmos partidos mereceu a nossa maior atenção, particularmente em matéria de ambiente, e, de modo a melhor esclarecer o eleitorado acerca das propostas partidárias, exploramos algumas das mesmas, nomeadamente no que concerne à redução da emissão dos gases com efeito estufa, ao incentivo à agricultura, à mobilidade e ao uso dos recursos energéticos. Verificamos que a difícil situação pandémica que o país e o mundo atravessam tem desviado a nossa atenção, mas não deve fazer esquecer a importância do combate às alterações climáticas e da proteção do ambiente. De facto, de acordo com o Instituto para o Mar e Atmosfera (IPMA), no final de dezembro de 2021, Portugal mantinha uma situação de seca meteorológica moderada a severa em quase todo o território, mostrando o quão importante é, neste momento, definirem-se políticas estruturais e medidas urgentes de combate às alterações climáticas.
Depois de analisadas as linhas gerais dos Programas Eleitorais dos Partidos Políticos com assento parlamentar, apresentados nas respetivas páginas eletrónicas, concluímos que todos eles manifestam preocupações e medidas mais ou menos ambiciosas e exequíveis. Contudo, a relevância que lhe é conferida é claramente diferente entre partidos. Como principais partidos dedicados à conservação da Natureza, apresentamos o Partido dos Animais e Natureza (PAN) e o Livre. De facto, o PAN sugere a constituição do Ministério do Ambiente, Biodiversidade e Proteção Ambiental, bem como a criação de uma Comissão Independente para o Clima, Energia e Transição. Em paralelo e face ao atual contexto de emergência climática, o Livre aposta num Novo Pacto Verde, que consiste num plano de investimento ecologicamente responsável a médio-longo prazo que utilizaria verbas, por exemplo, do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e da Política Agrícola Comum (PAC), de modo a dar importância às fontes renováveis de energia. Este último aponta ainda a necessidade de criar uma “Task-force” para a crise climática, que acompanhe a evolução das emissões de gases com efeito de estufa (GEE), e tenha base legal para avançar com a implementação de medidas de carácter urgente, bem como aposta na ciência e nos investigadores portugueses para introduzir a inovação necessária à modernização da gestão das redes e às formas de armazenamento de energia e no reforço das interligações energéticas internacionais.
No que diz respeito à conservação da Natureza e preservação da Biodiversidade, todos os partidos almejam a redução das emissões nacionais de gases com efeito de estufa até 2030. Relativamente a esta matéria, o Partido Socialista (PS) propõe concretamente reduzir, até 2030, 55% as emissões dos GEE, aumentar para 47% o peso das energias renováveis no consumo final bruto da energia e reduzir 40% das emissões do setor dos transportes e mobilidade; até 2026, pretende aumentar para 80% o peso das energias renováveis na produção de eletricidade. Já o PSD propõe implementar planos municipais de descarbonização e premiar os municípios que mais contribuírem para o cumprimento dos objetivos ambientais de Portugal através dos seus Planos Municipais de Descarbonização.
De um modo também global, os partidos propõem a defesa e fomento da agricultura e pecuária, o PAN surge, assim, como defensor de uma transição da agricultura convencional para uma agricultura mais sustentável e biológica ou equiparada, enquanto que o Partido Social Democrata (PSD) aposta em cativar um maior número de jovens agricultores, com medidas mais apetecíveis do que as atuais. O Chega planeia incentivar a aquisição de produtos locais e nacionais pelos portugueses, de modo a aumentar a resiliência local e nacional e compromete-se a reforçar as medidas de apoio à agricultura familiar, concretamente ao promover a internet de banda larga nas zonas rurais e desenvolver políticas que assegurem que os projetos de energias renováveis garantam rendimentos aos moradores. O CDS – Partido Popular (CDS-PP) compromete-se a defender o mundo rural bem como a sua cultura, memória e tradições. Para tal, pretende defender os métodos tradicionais de produção, promovendo a produção nacional, bem como atribuir benefícios fiscais à contratação no setor primário e conceder apoios ao setor do leite e outros setores produtivos.
No que concerne à proteção dos seres vivos e da floresta, o PS pretende alargar a criminalização dos maus tratos animais, abrangendo não apenas os animais de companhia, bem como a criação de um regime simplificado de apoio aos pequenos proprietários florestais – Vale Floresta, atribuindo ao proprietário um determinado montante de acordo com a área (ha) e as intervenções que se propõe desenvolver (ações limpeza, incluindo desbaste e remoção de material lenhoso, rearborizações). É também prioridade para o Chega combater o “flagelo dos incêndios florestais”. É neste campo que se verificam as maiores diferenças entre PAN e CDS-PP, uma vez que o primeiro pretende promover uma política pública de redução do consumo de produtos de origem animal e de incentivo a uma alimentação saudável de origem vegetal, enquanto que o segundo defende que “a caça, as corridas de touros e todas as manifestações culturais devem ser preservadas e defendidas” e pretende diminuir o IVA (para 6%) na tauromaquia.
Relativamente à mobilidade sustentável, também se encontram pontos em comum, nomeadamente, a defesa de um maior investimento nos transportes públicos, tornando-os mais atrativos e mais amigos do ambiente, convertendo as frotas públicas rodoviárias para modo elétrico, uma forte aposta na ferrovia e desincentivos à utilização de veículos privados. O PAN pretende estabelecer o fim da comercialização de veículos com motor de combustão até 2030 e a Iniciativa Liberal (IL) vai mais longe e propõe criar um programa de incentivo ao abate de veículos em fim de vida (VFV) com o apoio à compra de viaturas com zero emissões. O PS propõe manter a redução dos preços dos passes em todo o território, através do Programa PART, e apoiar a renovação de frotas de transporte publico com veículos de emissões nulas ou reduzidas. O Bloco de Esquerda (BE) pretende que os transportes públicos passem a ser tendencialmente gratuitos (começando pelos jovens até aos 18 anos, pessoas com mais de 65 anos e pessoas com deficiência) e propõe a descida da fatura da eletricidade com vista à erradicação da pobreza energética. Dentro de várias outras propostas, destaca-se a promoção, por este partido, de meios de mobilidade suave através da construção de ciclovias e sistemas de bicicletas partilhadas.
Relativamente à gestão dos recursos naturais, nomeadamente, dos recursos hídricos e energéticos, o PSD menciona a urgência da melhor gestão de recursos hídricos nacionais, propondo para tal um novo modelo que obriga a um envolvimento efetivo na gestão por parte de todos os agentes nacionais, regionais e locais, de natureza pública e privada, em que a coordenação com Espanha no caso das bacias internacionais, seja reforçada. Apresenta ainda a dessalinização como uma aposta tecnológica com capacidade de inovação e de responder aos desafios de gestão hídrica nacional. A Coligação Democrática Unitária (CDU) propõe uma política de recursos hídricos que, na base de uma nova Lei da Água, garanta o acesso à sua utilização como direito inalienável das populações, preserve e aprofunde a sua gestão pública e impeça a sua mercantilização. Nesta matéria, a IL aponta para a urgência de definir uma política efetiva e completa na gestão do ciclo de água e propõe a promoção de regadio e incentivos à eficiência energética. Ademais, alerta para a introdução da reutilização da água nas áreas de stress hídrico e para a redução das perdas de água na distribuição municipal. Acerca da exploração energética, o PAN manifesta a obrigação de impedir a concessão de licenças com vista à prospeção e/ou exploração de lítio e/ou outros minerais em áreas protegidas e/ou com elevado valor natural a menos de 20 km de povoações, assim como a IL defende a transição energética, nomeadamente o encerramento de instalações de produção de energia com base em combustíveis fósseis, o aumento da produção de energias alternativas e renováveis, o combate à pobreza energética, a descentralização da produção energética, com o fomento de unidades de pequena produção energética e autoconsumo local e criação de incentivos para a construção e renovação de habitações mais eficientes energeticamente, cujos custos, segundo a IL deverão ser deduzidos em sede de IMI. Ainda sobre a gestão de recursos, nomeadamente de resíduos, a CDU pretende o combate à obsolescência programada, utilizada em grande escala pelas multinacionais, contrariando a redução do período de vida útil de bens e equipamentos, enquanto que a IL defende a criação de um plano de ação nacional dirigido a otimizar o fluxo de Recolha de Resíduos Elétricos e Eletrónicos.
Muitas propostas ficam ainda por apresentar, pelo que convidamos o leitor a fazer uma análise mais pormenorizada dos respetivos Programas Eleitorais de cada partido. Concluímos que, apesar de umas medidas serem mais pertinentes e/ou realistas que outras, todas são importantes na promoção sustentabilidade da Natureza, da Biodiversidade e dos respetivos Recursos, pelo que propomos aos respetivos partidos, que se unam de uma forma urgente, séria e responsável e contribuam em conjunto com a Sociedade Civil e para um Mundo mais consciente, responsável, proactivo e atento. Pois se há algo que temos a certeza é a de que o relógio não para e as evidências de que estamos à beira do colapso climático apresentam-se-nos todos os dias.
Aproveitamos também para apelar ao voto, um direito e um dever de todos. De facto, nas últimas eleições presidenciais, a taxa de abstenção, segundo a PORDATA, rondou os 60%, situação preocupante para a democracia que se vê menos representada por falta de participação. Só com a diminuição deste valor conseguiremos ter uma opinião efetivamente representativa do eleitorado português. Deste modo, incentivamos a que se informe, tome uma decisão consciente e use o seu direito de voto!
Mariana Almeida e Paula Robalo
Direção da TREVO